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Artigo: “Absurdo”, por André Naves

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Absurdo!

André Naves (*)

– Absurdo você fazer isso, Aldir! Porra! Que merda! Marquei consulta com você, psiquiatra, tomei o endereço do consultório, e quando chego aqui me deparo com essa bodega! Eu devia desconfiar… Quem busca o lirismo da humanidade com a música não consegue ser sério.

– Calma, Di! Até parece que você não busca, com suas pinturas, a poesia do povo. Eu aprendi a fazer isso com você. Na “Samba” você me ganhou: dá para sentir o batuque da sensualidade na tela. Toma uma comigo e sossega o faixo. Você, Di, ensinou o Brasil a enxergar o Brasil! Desde o catálogo de 22 até o “Baile Popular”, é puro suco da gente. E aqui, a gente pode pedir umas e outras, comer uma moelinha acebolada, ouvir os sons do mundo…

– A poesia da rua… O canto da calçada! A canção das nossas raças, como diria o Pinheiro! Ou você, com o Mestre-Sala…

– Eu sabia que você ia se acalmar. O que a gente vai tomar? 2 cachaças pra abrir o apetite? Um torresminho? Sabe o João? Quando a gente tava escrevendo o “Corsário” ele, com aquela musicalidade gigante, queria ser o primeiro a plantar uma nova era. Acho que deu pra sentir na letra, né?

– Acho que deu mesmo. A ancestralidade do mar salgado, uma certa metáfora das ondas, nossa história de tanta luta, expropriação e amor! Puta música! Apoteose pura! Quando o Oscar desenhou o sambódromo ele deve ter ouvido vocês!

– E visto seus quadros! Certeza que viu! Lógico! Só se enxerga o Brasil depois de Di Cavalcanti! Mas, fala, você veio para uma consulta ou não?

– Sério que você quer falar disso aqui?

– Muito sério! Esse aqui é o melhor consultório que se pode querer. Vários pacientes meus já vieram aqui. Eu já falei: a sensibilidade popular faz parte do diagnóstico e do tratamento. Estar aqui, nesse ambiente, é um santo remédio!

– Só me preocupam os efeitos colaterais disso.

– Não me vem com essas de puritano! Quem pintou como você, quem escolheu temas tão nossos, não tem o direito disso!

– Sabe o que é, Aldir? O Brasil tá queimando! Calor, fumaça, secura. Cadê o paraíso que a gente sonhou? Tomo mundo fica escondido, guardado por D´us, contando o vil metal. Cadê a alteridade brasileira? Cadê as mãos dadas? Cadê o povo? Eu vi quando você compôs “O Bêbado e o Equilibrista”. Vi o “Mestre-Sala dos Mares”. Vi esses hinos guiando a gente rumo à Democracia! E agora, Aldir? É só selvageria, cada um por si. Acho que cansei desse Brazil. Quero o nosso Brasil!

– Isso não é com psiquiatra, infelizmente. No fundo é seu coração chorando de saudades do porvir… Virá? Não sei…

* André Naves é Defensor Público Federal, especialista em Direitos Humanos, Inclusão Social e Economia Política. Escritor, professor, ganhador do Prêmio Best Seller pelo livro “Caminho – a Beleza é Enxergar”, da Editora UICLAP (@andrenaves.def).

Informações:

Assessoria de imprensa do Defensor Público Federal André Naves

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